Voltei à Gâmbia no final do ano (pela terceira vez em 2019) e fiquei até janeiro de 2020.
Tinha as obras do terreno que comprara em junho para acompanhar e tinha a intenção de lançar o Lya Project expandindo para a Gâmbia a ação da ONGD que fundei em 2016, primeiramente destinada a ajuda humanitária no Nepal.
Tal como o projeto da Associação Humanity Himalayan Mountains no Nepal, a missão do Lya project é apoiar a educação de crianças desfavorecidas, na sua maioria órfãs e, se possível, ajudar também a família de acolhimento. Enquanto no Nepal as crianças nestas circunstâncias são muitas vezes colocadas em lares, o sistema social na Gâmbia funciona de maneira diferente e, como tal, as crianças ficam ao cuidado da chamada ‘família alargada’.
E foi por esta família que comecei, a família que me acolheu tão bem na primeira vez que visitei o país. Um casal cuidando dos filhos um do outro, mas que não têm filhos em comum. Porque é assim em África, quando a esposa morre o marido casa com uma das suas irmãs e se este marido morre a irmã casa com um irmão dele. Tudo para bem das crianças, para que não fiquem sem família, sem apoio. Gente humilde, ele trabalha como segurança numa área residencial e ela vai vendendo frutos e amendoins à beira da estrada.
E o casal cuida não só dos filhos de ambos, mas dos sobrinhos e dos filhos dos vizinhos lá da terra que têm aqui em Bakau, perto da capital, mais oportunidade de continuar os seus estudos em vez de percorrerem quilómetros até à escola mais próxima.
A Gâmbia, é conhecida como a "costa dos sorrisos", pois as pessoas são afáveis, hospitaleiras e alegres, mas tem imensas limitações, nomeadamente no domínio da educação. Por isso é importante investir nos estudos das crianças e jovens e muito em especial das meninas, até há pouco tempo privadas do acesso à escola.
As crianças que apresento em seguida frequentam escolas corânicas porque as suas famílias não têm meios para as colocar numa escola regular de ensino em inglês. Em geral também abandonam a escola cedo, pois os mesmos motivos impedem a continuação dos estudos. A maioria delas vive no ‘compound’ que descrevi, mas há outras que fui conhecendo e para as quais gostaria de encontrar padrinhos e madrinhas que as patrocinem.
- Mariama Marong: Tem 18 anos, estudou até ao 7°ano na escola corânica e quer prosseguir os estudos até entrar num centro de formação pré-profissional.
- Fatoumatta: Tem 4 anos. A sua família é oriunda do Senegal. O pai morreu, a mãe casou novamente naquele país deixando a miúda aos cuidados da irmã mais nova que vive numa aldeia do interior. Veio agora viver com o tio e vai para o infantário da escola corânica em setembro.
- Isatu Lamin: Tem 5 anos e frequenta o infantário numa escola corânica. É irmã da Olga Lamin que ainda não frequenta a escola. Os pais são pobres e vivem num anexo com poucas condições.
- Balagie: Um jovem educado, bem-disposto, super atencioso, sempre pronto a ajudar o outro. Cresceu sem o pai que faleceu quando ele era criança, e sem mãe idónea que o sustentasse, pelo que há muito vive com os tios que dele tomaram conta. Estudou até ao 9°ano na escola árabe e por aí ficou. Porque continuar os estudos a partir daí para tirar um curso mais especializado significa investir num uniforme, calçado, inscrição inicial, livros, material escolar, transportes. E o Balagie nunca teve ninguém que o ajudasse nesse arranque inicial de ano letivo. Não tem trabalho fixo, oferece-se como voluntário para a limpeza da piscina de um hotel e outros biscates, os trocos que ganha dá para ir sobrevivendo no dia-a-dia. O que ele gostava? De continuar os estudos na escola técnica para poder vir a trabalhar na instalação de antenas satélite.
Quando estive anteriormente no país, festejámos os aniversários da Awa, que este ano fez 12 anos, e das princesinhas Natu e Olga que completaram 3 aninhos e para as quais preparámos uma pequena festa.
E o apelo foi surtindo efeito.
E assim foi feito: Inscrevemos o Alagie (Balagie para os amigos) no Curso de Instalação de Satélites, algo que ele tanto desejava. As aulas iniciaram-se em outubro e o Balagie regressou, firme e entusiasmadíssimo, à escola depois de tantos anos sem a possibilidade de a frequentar por dificuldades económicas, pois desde cedo que se sustenta a si próprio e o que vai ganhando só dá para o básico.
Também agradecemos as carteiras, sacos e roupa doada, em especial às amigas e sócias Maria Odete e Ester Silva, que distribuímos por miúdos e graúdos. E aos demais amigos e colegas que doaram material escolar. Neste caso, o transporte dos bens foi feito em māo já que, diga-se de passagem, o envio pelo correio se torna dispendioso.
Aliás, tive a oportunidade de visitar a sua escola e de confirmar tudo isto junto dos professores. Por seu lado, a pequena Natu tem-se revelado uma aluna atenta no infantário e muito satisfeita com a sua nova rotina escolar.
Quanto à Fatoumatta, como não conseguimos para ela nenhum patrocínio para este ano letivo, ela acabou por regressar à sua aldeia, a três horas de distância, onde vive com a mãe adotiva.
Irá percorrer diariamente mais de uma hora para chegar à escola onde aprenderá o alfabeto árabe e os primeiros preceitos da leitura do Alcorão.
Na minha nova área de residência, em Brufut, pois fiquei no mesmo quarto que alugara anteriormente, conheci o novo membro da família, o quarto filho dos proprietários do ‘compound’, que nascera na minha ausência, entre setembro e dezembro. A mãe toma conta da casa, enquanto o marido ganha a vida na Alemanha.
Posteriormente, os alunos da Grace Baptist School em Ghanatown responderam nos mesmos moldes e os postais foram enviados para Portugal e entregues aos alunos da turma 5ºA da Escola Básica Egas Moniz, concelho de Sintra.
Ghanatown é uma pequena vila de pescadores oriundos do Gana que aqui se fixaram há várias gerações. São maioritariamente cristãos e frequentam as várias igrejas aqui existentes onde se celebram as missas.
Nas proximidades situa-se o terreno que adquiri e, portanto, tinha também a intenção de estabelecer parcerias com as escolas da região para futuros projetos de voluntariado, tal como a Ass. HHM já fazia no Nepal.
No terreno continuei a acompanhar as obras de construção do muro de vedação e os procedimentos de limpeza do mesmo. Fui também conhecendo a criançada e os futuros vizinhos desta área para onde me mudarei um dia.
O plano é aqui empreender em algo, por exemplo construir quartos para alugar, que de alguma forma rentabilize e traga melhoria de vida aos locais que irão coordenar o projeto e que sustente o próprio projeto de ajuda a crianças e famílias carenciadas. Encontrar pessoas de confiança é vital.
Gostaria de otimizar o trabalho feito no Nepal e não estar dependente do meu constante esforço para angariar fundos para a Associação HHM (que não tem qualquer ajuda estatal) para sustentar mensalmente o lar das crianças em Pokhara e fazer face a todas as despesas, escolares e não só, relativas às crianças abrangidas. Este tremendo esforço da minha parte e a posterior constatação de que havia alguns desvios financeiros, naquele país, para outros efeitos que não o apoio direto às crianças, paralisaram-me, desmotivaram-me e inibiram-me, inclusive, de continuar a atualizar este blog por vários anos.
De resto, desta vez na Gâmbia, fiz praia em dezembro, continuei a frequentar os vibrantes mercados locais, observei a azáfama diária dos pescadores e as suas coloridas pirogas, apreciei os fantásticos pores do sol e assisti a espetáculos com música ao vivo.
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