Após doze dias em Portugal resolvi regressar à Gâmbia. Algo neste país me chamava de volta. Na primeira vez apenas passei por lá, agora queria tempo para estar, contemplar, para conhecer mais e melhor, sem pressas nem grandes planos, não só do país em si mas das suas gentes e da sua cultura. Foi talvez a humildade, a generosidade e a hospitalidade deste povo que me tocaram profundamente, tal como me acontecera quando visitei o Nepal pela primeira vez (em 2005).
Aluguei um quarto num ‘compound’ (tipo um condomínio fechado com cozinha comum e vários quartos, estes já com mais condições que incluem sala anexada e casa de banho), muni-me de comodidades como sendo televisão e frigorífico e comprei uma scooter para facilitar as deslocações e não estar dependente das carrinhas públicas, geralmente sobrelotadas.



E mudei de área, em vez de Bakau fui para Brufut, uma zona emergente perto de bonitas praias.


Primeiro quis conhecer melhor a curta mas magnífica costa (aproximadamente 80 km de extensão), com belas praias de areia branca e fina, ladeada por luxuriante vegetação.
Percorri-a de uma ponta à outra, desde Cape Point, na foz do rio Gâmbia, até ao ponto mais meridional: o rio Allahein que faz fronteira com o sul do Senegal (Casamansa).
Aliás, percorri a estreita língua de areal neste extremo sul entre o Oceano Atlântico e a foz do rio Allahein, esta já no Senegal.
Ou seja, é uma zona sem controlo de fronteira onde podemos ir a pé e até visitar uma aldeia na outra margem do rio: Niafarang, uma aldeia tradicional habitada essencialmente pelas tribos Balanta e Karoninka, cristãos de Casamansa. No rio os pelicanos passam e mulheres de ambos os países mergulham para colher as ostras que crescem nos troncos dos mangais.
Mergulhei na água tépida da 'Costa dos Sorrisos' e conheci alguns dos excelentes hotéis e resorts situados à beira-mar, dois dos quais geridos por portugueses ao serviço de uma empresa alemã.
Experimentei diferentes e elegantes restaurantes onde podemos saborear não só a cozinha gambiana, mas também de diferentes partes do mundo.
Porém, prefiro descobrir aprazíveis e encantadores recantos geridos pelos afáveis habitantes, onde posso saborear iguarias e bebidas locais com preços bem mais em conta. E uma das agradáveis descobertas foi o tasco 'Lisbon Fast Food', com ótimos petiscos, gerido por um libanês que vivera vários anos em Portugal...
Instalada nestes recantos ou fazendo longas caminhadas pela praia vou apreciando os hábitos e os rituais gambianos. O gosto pelos jogos e o exercício físico no areal e as festas 'de arromba' na praia ao fim de tarde e sobretudo aos fins de semana.
As orações a horas certas, nas mesquitas ou nas ruas. E para a minoria cristã, a missa matinal aos domingos.
Também os animais têm os seus ritmos e gostos, onde se incluem vagarosos passeios bovinos pelas praias que os atentos e esfomeados abutres se encarregam de limpar sempre que há restos mortais de pescado e não só.
Porque o pescado abunda e é essencial na mesa, seja dos restaurantes (o maior, mais caro e com poucas espinhas), seja na dos habitantes locais (o mais miúdo, mais barato e com mais espinhas).
Dos vários portos de pesca ao longo da costa todos os dias partem pirogas coloridas que voltam carregadas de peixe e marisco. E é um belo espetáculo assistir a toda esta azáfama pesqueira de que Tanji é o expoente máximo no país.
Além disso, esta localidade, próxima de uma grande área florestal protegida, tem também um interessante museu etnográfico dedicado à vida e costumes tradicionais.
Os aspetos negativos nestas áreas (de pesca, mais remotas e nas praias afastadas dos hotéis) são os resíduos plásticos, o lixo atirado para o chão e despejado ao relento, que denotam todas as coisas que ainda não há na Gâmbia, como a consciencialização ambiental da população e a separação e recolha sistematizada de detritos…
Frequento os mercados e estaminés locais, saboreio novos frutos e observo árvores e plantas exóticas.
E aprecio a elegância da mulher gambiana e os vistosos vestidos e indumentárias.
Nas ruas encontro fãs e nos supermercados produtos portugueses.
E claro que gosto de visitar monumentos, lugares de culto, sagrados, construções originais em termos de arquitetura, mas a Gâmbia não tem assim tanto de extraordinário, à exceção de bonitos edifícios com as tradicionais coberturas de colmo e vários locais de valor cultural ou histórico, alguns dos quais referi na primeira visita ao país (
aqui), como sendo: Museu Nacional da Gâmbia, Arco 22, Mercado Albert, situados na capital, Banjul, que ainda conserva umas casas coloniais e, do outro lado do rio, o Forte Bullen, a pequena povoação de Juffureh, a Ilha Kunta Kinteh e o seu Forte James. Tinha a intenção de visitar, desta vez, outros sítios de interesse, mais afastados da capital.
Mas a rica herança do país, as suas tradições e costumes ainda tão presentes sobretudo nas aldeias, pode saltar-nos à frente nos espetáculos de música e dança ou ao virar de qualquer esquina através do Kankurang, um personagem mascarado, envolto em folhas, casca de árvore e fibras vermelhas, que desempenha um papel central nos rituais de iniciação masculina e na vida comunitária. O Kankurang é visto como um espírito protetor que traz ordem, justiça e transmissão de conhecimentos ancestrais, além de afastar espíritos malignos.
O que a Gâmbia muito oferece são diversos parques naturais e áreas de conservação, locais aprazíveis no meio de incrível natureza, ricos em biodiversidade e ideais para ecoturismo e observação da vida selvagem. O país é também lar de numerosos locais naturais sagrados que possuem significado cultural e espiritual, muito importantes para as comunidades locais e com grande valor ecológico.
O objetivo destas reservas e áreas naturais é preservar a fauna selvagem remanescente da Gâmbia e fornecer um refúgio seguro para que a flora e a fauna floresçam sem interferência indevida do homem. O país não tem o grupo de animais considerados os "big five" (leão, elefante, búfalo-africano, leopardo e rinoceronte), mas nestas áreas protegidas de palmeiras e florestas, ecossistemas ribeirinhos, manguezais, savanas e planícies salgadas, podem ser observadas variadas espécies de aves e peixes, ostras, grandes populações de macacos e chimpanzés, crocodilos e outros répteis e o próprio rio Gâmbia constitui um dos últimos refúgios para o hipopótamo, espécie atualmente muito ameaçada.
O Parque Florestal de Bijilo, também conhecido como Parque dos Macacos, tem trilhos no meio da floresta costeira onde podemos observar de perto os macacos Vervet ou Green Monkey e os Western Red Colobus que ali circulam livremente. A Reserva Natural de Abuko é uma área de conservação, também com percursos pedestres, para observação de vida selvagem, incluindo pássaros, répteis e mamíferos.
A Floresta Cultural de Makasutu é uma reserva florestal privada de ecoturismo, que fica a 5 quilómetros da cidade de Brikama e a sul da capital, Banjul. O parque natural tem uma área de 405 hectares e abrange o Mandina Bolong, um afluente do rio Gâmbia. A área selvagem protegida é uma extensão intocada de ecossistemas ribeirinhos, desde palmeiras e florestas de madeira dura, mangais, savanas e planícies salinas.
O bilhete de entrada inclui almoço (tipo buffet ao ar livre com comida orgânica) no bar Baobab, agradável caminhada ao longo dos trilhos da floresta tropical onde observamos termiteiros, pássaros, macacos ou babuínos, havendo também uma demonstração de como se sobe às palmeiras para extrair a seiva a partir da qual se faz o vinho de palma. Em seguida, um passeio de barco por entre os mangais.
Floresta Cultural de Makasutu
Acredita-se que a floresta seja sagrada, estando ligada à lenda do "Ninki Nanka", um ser mítico que a protege. Os habitantes locais usam as árvores e as plantas que crescem nesta terra sagrada para curar várias doenças.
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